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18 de setembro de 2010

O andar do bêbado

image Alerta. Esse post é chato pra cacete e não diz muita coisa.

Quais são os fatores que determinam o sucesso ou fracasso na profissão, nos relacionamentos ou qualquer outra área da vida? Quando surge uma idéia genial, será que apenas a genialidade dessa idéia garante o seu sucesso, ou existem outros fatores tão ou mais importantes capazes de traçar o seu destino?

Para sorte de uns e azar de outros, o talento ou capacidade inata é apenas um dos ingredientes que compõe o sucesso (seja qual for a sua definição de sucesso). Ao lado desta caminham dois outros fatores determinantes no desenrolar de qualquer situação - seja uma partida de pôquer, sua carreira profissional ou o seu casamento. Esses fatores são a perseverança e a sorte ou, melhor dizendo, o acaso. E é sobre este último que eu gostaria de rascunhar algumas maltraçadas palavras.

Pra início de conversa, o que é o acaso?

Imagine que você está andando na calçada e encontre no chão uma nota de cinquenta reais. Nossa, que legal! Você está com sorte. Você está lá na calçada parado, olhando pra cara da onça, todo feliz. Nesse instante um carro desgovernado invade a calçada e passa por cima de você e da nota de cinquenta reais.

Os dois eventos acima são exemplos de manifestação do acaso. O acaso é qualquer evento que ocorre sem uma causa ou explicação aparente, ou que fogem à nossa previsão.
Isso não significa que tais acontecimentos não possuam uma causa. É certo que possuem, mas são tantas e tão complexas que não podemos calcular nem prever a sua ocorrência. Quando jogamos um dado, o resultado depende de inúmeros fatores: a posição inicial, a velocidade, a altura, a aceleração, o peso do dado, o material do dado e da superfície sobre o qual é atirado, o coeficiente de atrito, entre muitos outros que são desconhecidos.

Então, num gesto de resignação, atribuímos à sorte, ao azar, ao acaso e até mesmo a Deus ou à posição das estrelas a ocorrência de fatos sobre os quais não possuímos nenhum conhecimento prévio.

Deus não joga dados

Se existisse uma pessoa ou uma máquina que conhecesse todos os fatores envolvidos em um lançamento de dados e tivesse controle sobre esses fatores, então o resultado poderia ser calculado e alcançado de acordo com a vontade dessa pessoa e, nesse momento, o acaso deixaria de existir nesse lançamento de dado.

Einstein disse uma vez que “Deus não joga dados”.
Deixando de lado a discussão sobre a fé de Einstein ou sobre a existência de Deus, é possível admitir que o acaso, de fato, não existe, e é somente uma ilusão que criamos como consequência da nossa incompreensão ou ignorância acerca de todos fatores que compõem um evento qualquer.

image

Tudo o que acontece no universo, dos nossos sonhos até os buracos negros, dos movimentos das marés à banda restart, tudo tem uma causa. Porém, as causas conhecidas desses acontecimentos são uma parcela ínfima de todas as causas existentes, nós enxergamos apenas a ponta do iceberg, e todo o restante que fica submerso no desconhecido, inacessível ao nosso conhecimento, chamamos de acaso (ou vontade de Deus).

Ignorância e prepotência

Não obstante as fatos da vida terem causas em sua maioria desconhecidas, nós temos a tendência quase irresistível de nos apegarmos com vigor somente àquilo que conhecemos e desprezarmos o fato de que existe algo além de nossa compreensão. Assim, nós interpretamos o mundo em nossa volta por meio de uma base insuficiente de informações e, consequentemente, chegamos a conclusões equivocadas.

Indo além, é fácil resistirmos à idéia de que muitas coisas ocorrem à revelia do nosso conhecimento pois, por uma característica da natureza humana, precisamos nos sentir sempre no controle de tudo ao nosso redor. Nós queremos ter explicação para tudo (isso é bom) e achamos que tudo se explica com base no que já conhecemos (isso é ruim).

Assim, negamos a importância do acaso nas nossas vidas. Afinal, quem fica confortável sabendo que o seu emprego, a pessoa com quem é casada há tantos anos, a roupa que está vestindo e até o que almoçou hoje depende tão pouco da sua vontade?

No frigir dos ovos

O acaso está mais presente em nossas vidas do que podemos perceber e bem mais do que gostaríamos que estivesse. Afinal, é fácil se sentir desconfortável com a idéia de que não temos tanto controle assim das nossas próprias vidas. Mas, a despeito do que achamos ou gostaríamos, o acaso está aí agindo como um verdadeiro deus da probabilidade direcionando nossos passos.

Esse post leva o título do livro homônimo, de L.Mlodinow, que trata do assunto com muito mais propriedade e profundidade.

1 de fevereiro de 2010

Sartre, Lincoln e o BBB 10

Vou te falar uma coisa. Big Brother Brasil é muito bom. Babacas Brigando e fazendo Barraco por qualquer Bobagem. O BBB é a comprovação in vitro da afirmação de Sartre: O inferno são os outros.

Eu sempre desprezei esse programa por achar que se tratava de um despropósito absoluto, uma manifestação perfeita da falta de conteúdo do entretenimento televisivo. Eu estava enganado. Por increça que parível o BBB tem conteúdo. O conteúdo do programa é a falta de conteúdo das pessoas.

Por conteúdo, podemos entender os valores morais e éticos, os conceitos e preconceitos e principalmente a educação e boas maneiras das pessoas. Alí fica tudo exposto, como numa jaula sob a obseravação constante de dezenas de câmeras e milhões de espectadores. Não dá pra fingir. Não o tempo todo. Alí cedo ou tarde todos os participantes se mostram como são, em suas qualidades e virtudes.

Como disse Abraão (lincoln, não o bíblia) “Alguém pode enganar poucos por muito tempo, muitos por pouco tempo, mas não todos por todo o tempo".

E sob esses aspectos sociais, antropológicos e até psicológicos, o programa é um prato cheio para quem gosta de observar o comportamento humano. É uma oportunidade singular de estudar (e julgar também, claro. Nada mais gostoso que vibrar com a indicação de Tessália para o paredão) o desenvolvimento dos relacionamentos. É a novela da vida real.

Essa aí de cima vai rodar rapidinho. Mala demais (mais chata que eu, até).

20 de novembro de 2009

Os três mendigos

Ainda na onda do filme Anticristo de Lars Von Trier, vale a pena viajar um pouco sobre o significado dos três mendigos: Sofrimento, Dor e Desespero que, quando reunidos, trazem a morte. Figura aqui mais uma antitese simbólica do cristianismo. Enquanto os três(?) Reis Magos da bíblia se reúnem para presenciar o nascimento do cristo, os três mendigos do filme se reúnem para presenciar a morte. Enquanto os reis da bíblia celebram o divino, os mendigos da natureza festejam o mundano e o natural.

Expulsos do Paraíso


Reza a lenda que Deus criou o universo, a terra, a natureza e o homem. Logo no primeiro capítulo do primeiro livro da bíblia, a criação é narrada em linguagem épica. E já nesse mesmo primeiro capítulo se vê claramente que a religião judaico-cristã (daqui em diante chamada apenas de Religião) coloca o homem acima da natureza, em uma posição de destaque.

Na narrativa religiosa o homem não faz parte da natureza, essa existe com a finalidade de servir aos propósitos do homem. O homem é especial, meio-divino, pois além de ter sido feito à imagem e semelhança do próprio Deus, recebeu de Sua boca o sopro da vida, o pneuma, que é o espírito divino.


Alocado no Jardim do Éden, o homem desfrutava de sua superioridade, tendo tudo a seu serviço. Não havia sofrimento, dor, angústia ou morte. Era a existência ideal. Os animais e toda a natureza lhe era submissa. Contudo, coube ao homem desobedecer a instrução divina e comer do fruto proibido e, por isso, ser expulso do paraíso. Como consequência da expulsão, a existência passou a ser acompanhada de sofrimento, dor, angústia e morte.

Dogmas


Assim, a Religião cria um de seus preceitos mais importantes e que serve de fundamento para toda a sua concepção Moral: O de que toda a dor, sofrimento e desespero que há no mundo não são simplesmente fatos naturais, mas sim consequência da influência maligna sobre o homem. Se o homem sofre, se o homem sente dor, se padece de doenças e angústia e se, por fim, o homem morre, não é porque essas são simplesmente as condições inexoráveis da existência, e sim porque o mal habita entre nós, por meio do pecado.

Em última instância, o homem é um pobre coitado, um bosta n’água incapaz de agir por sua própria razão ou vontade. Se faz o mal, é porque o diabo o tentou e o dominou, se faz o bem é porque foi inspirado por Deus. Lembra daqueles desenhos da Disney que o Pato Donald ficava em dúvida sobre o que fazer e na mesma hora apareciam um anjinho e um diabinho cochichando em seus ouvidos? É isso que a Religião prega.


Veja como o círculo se fecha: Para a Religião o homem não é integrante da natureza, é um ser superior cuja existência é dotada de um significado divino. O homem é o tal, imagem e semelhança de Deus feito para viver eternamente e, assim sendo, não deveria estar sujeito a nada que cause sofrimento à existência, muito menos deveria estar sujeito ao fim da existência.

Os três mendigos


Não há indícios históricos ou geográficos de que tenha havido em algum momento o Jardim do Éden, e tudo o que leva os religiosos a acreditarem nas descrições bíblicas de uma existência livre de sofrimento é a fé. Ao contrário, a memória de todos os povos que já passaram pela terra relatam a existência do sofrimento como uma realidade pungente.


O fato é que somos invariavelmente submetidos às consequências de uma existência frágil e passageira, e essas consequências englobam a dor, o sofrimento, o desespero e finalmente a morte. Enquanto a Religião exclama “O maligno reina no mundo!” e, dessa forma, afirma que o sofrimento e a morte são consequências do pecado – criando consequentemente uma aversão moral a esses fatos - a razão diz “O caos reina no mundo!” e afirma que o sofrimento e a morte são consequências naturais da vida.

13 de novembro de 2009

Queremos Saber

Nesses últimos dias tenho escutado muito a Cássia Eller, mais especificamente o álbum Acústico MTV, e mais especificamente ainda a faixa nove.
A música se chama Queremos Saber, e é uma composição assombrosa de Gilberto Gil. Quando comecei a escutar o disco, essa música passou um pouco despercebida, a interpretação comedida e despretensiosa não chama muito a atenção. Mas quando parei pra escutar direito fiquei impressionado com a profundidade da letra. É filosofia pura sob forma de versos e acordes. Uma pérola.


Ao som suave de um violão e uma orquestração quase imperceptível o protagonista da música, o homem comum, faz diversos questionamentos acerca dos avanços tecnológicos e de que forma eles melhoram a situação da humanidade, ou melhor, questiona se, de fato, eles melhoram a nossa condição. Nos últimos anos foram tantas as mudanças de ordem prática, tantas invenções, tecnologias e avanços científicos que nos vemos em um admirável mundo novo. Mas, por outro lado, continuamos com os mesmos medos, preconceitos, limitações e mazelas que nos oprimem há milênios.

Queremos saber,
O que vão fazer
Com as novas invenções
Queremos notícia mais séria
Sobre a descoberta da antimatéria
e suas implicações
Na emancipação do homem
Das grandes populações
Homens pobres das cidades
Das estepes dos sertões

Emancipação do homem. A que o homem ainda está preso e precisa se libertar? O que será tão forte que nem mesmo todo o avanço científico é capaz de nos conceder alforria? Certamente não se trata de um atraso no conhecimento do mundo exterior e dos fenômenos físicos. O que ainda nos mantém aprisionados é a ignorância de nós mesmos. É a força maligna que, antes de tudo, nos impede de fazer questionamentos. É o medo de descobrir que nossas convicções estão erradas. Medo. E contra essa prisão toda a tecnologia do mundo é impotente.
Queremos saber,
Quando vamos ter
Raio laser mais barato
Queremos, de fato, um relato
Retrato mais sério do mistério da luz
Luz do disco voador
Pra iluminação do homem
Tão carente, sofredor
Tão perdido na distância
Da morada do senhor

Humanidade em trevas. Nesse trecho o homem questiona, esperançoso, se a luz do raio laser ou do disco voador é capaz de iluminar nossa existência, nossa consciência. Além de presos, estamos no escuro. Melhor, estamos presos pela escuridão da ignorância. Será que é a luz do raio laser ou a luz dos monitores de computador conseguirão iluminar nossa consciência? Que luz é essa, capaz de nos tornar seres iluminados por dentro? Novamente, é o conhecimento de nós mesmos. Cada um precisa buscar essa luz que somente se alcança por meio do pensamento filosófico, do pensamento crítico, do questionamento ao inquestionável. Essa é uma jornada solitária.
Queremos saber,
Queremos viver
Confiantes no futuro
Por isso se faz necessário prever
Qual o itinerário da ilusão
A ilusão do poder
Pois se foi permitido ao homem
Tantas coisas conhecer
É melhor que todos saibam
O que pode acontecer
Queremos saber, queremos saber
Queremos saber, todos queremos saber

A ilusão do poder. Onde vamos com toda essa tecnologia? Todo esse conhecimento - do mundo exterior, repito - nos deu poder sobre o mundo. Mais corretamente, nos deu a ilusão de poder, pois enquanto não formos senhores de nós mesmos não teremos poder nenhum. Enquanto estivermos nas trevas seremos servos da ignorância e do medo.


Gilberto Gil e Cássia Eller
Simplesmente genial a música. Simplesmente genial a interpretação. Que sensibilidade do Gilberto Gil para, em 1976, fazer essa composição que a cada ano e a cada nova invenção se torna mais atual. Quando à interpretação, nem é justo usar esse termo pois Cássia Eller não interpreta a música, ela vive a música.

3 de novembro de 2009

O sentido da vida

Qual o sentido da vida? Talvez essa seja a questão pseudo-filosófica que mais atormenta a vida das pessoas. De onde viemos? Por que estamos aqui? Para onde vamos? Questões como essas costumam ter tanta importância que verdadeiras multidões passam a vida procurando as respostas. Geralmente as Religiões apresentam as respostas. Nada mais natural, uma vez que são as religiões que lançam essas perguntas.

Antes de ser uma questão filosófica, o questionamento sobre qual o é sentido da vida é uma questão religiosa ou espiritual, no sentido místico da palavra. Ao se fazer esse questionamento, admite-se implicitamente que a vida, a existência, é dotada de significado e, ainda além, de um motivo. Cabe-nos então descobrir o sentido da vida, ou "Por que estamos aqui?".


Mas por que é praticamente unânime o entendimento de que a vida possui um sentido? O que leva bilhões de pessoas a acreditarem que sua existência é resultado de um motivo ou vontade? Experimente dizer a alguém que, talvez, a humanidade seja mera coincidência, e está armada a polêmica. Nós nos recusamos a aceitar que somos simplesmente o resultado de bilhões de anos de reações químicas. Temos que ser mais que isso, afinal seres tão especiais, pensantes, capazes de amar, sorrir e elaborar a teoria da relatividade merecem uma origem mais nobre do que o mero acaso.

Indo além, admitir que a vida possui um sentido ou significado implica admitir que existe uma vontade anterior à vida, uma vontade que deu origem à vida. E para haver uma vontade, é indispensável que haja uma entidade que seja possuidora dessa vontade. Entidade essa que é, em última análise, o Criador. E está fechado o círculo vicioso da Religião.

Para a Religião, o sentido da vida é que o Criador esteja reunido com suas criaturas, afim de que essas possam desfrutar a existência em toda a sua plenitude. Porém, por um motivo não muito claro, coube ao Criador manter as criaturas em um patamar inferior à essa plenitude - no caso, aqui na Terra - para que as criaturas pudessem, por meio do aperfeiçoamento pela dor, tornarem-se aptas à vida plena, que só existe no chamado plano espiritual. Pra quê, porra?

Somos narcisistas, mais que isso, somos definidos pelo narcisismo. Nos consideramos especiais e superiores ao resto de todo o universo. Somos o supra-sumo do cosmos, a expressão máxima da existência. Bem, somos isso tudo aos nossos próprios olhos. Portanto, não nos contentamos em apenas existir. Merecemos mais que isso, merecemos um significado, uma razão de ser, um objetivo. Para haver um motivo para nossa existência, é necessário que algo ou alguém anterior à nossa existência tenha desejado e efetuado a nossa criação. E assim nasce Deus. Deus é a manifestação máxima de nosso narcisismo.


Uma existência sem propósito

Indo na direção oposta, admitimos que a existência humana, assim como tudo no Universo, é desprovido de um sentido. Não há nenhuma razão de ser para tudo o que existe. Tudo é apenas fruto do acaso. Não somos especiais para ninguém além de nós mesmos. Que golpe duro no ego! Por isso é tão difícil alguém aceitar essa idéia. Por isso que chega a ser imoral a alegação da inexistência de Deus, pois implica em renunciar a importância cósmica que julgamos possuirmos. Mas, e se for assim? Qual a implicação prática dessa conclusão?

Deixando de lado as implicações morais, acredito que a primeira grande diferença que podemos notar nessa mudança de entendimento é justamente, ao contrário da primeira intuição que se possa ter, a valorização da vida. Se admitimos que a vida que temos é a única vida que teremos e que a morte põe termo à existência, essa vida passa a ter um valor muito maior do que se for encarada como uma simples passagem para outra vida. Todos os nossos esforços tenderão a ser direcionados para sermos felizes aqui, já que não haverá outra chance.

Também acredito que se torna mais fácil aceitar, compreender e trabalhar as nossas limitações e os nossos defeitos, em vez de encará-los como provações místicas ou resultados de uma vontade divina injustificada.

Atribuindo sentido à vida

Muito diferente de descobrir o sentido da vida, é dar sentido à vida. Enquanto tentar descobrir o sentido da vida é admitir que a mesma não nos pertence, e sim a quem lhe conferiu tal sentido, dar sentido à vida, por outro lado, é compreender que nossa importância não vai além da que nós mesmos nos damos e, dessa forma, o melhor que podemos fazer é aproveitar ao máximo visto que não há outra vida para ser vivida depois dessa. Somos livres para dar à vida o sentido que quisermos, inclusive o de crer que somos parte de um projeto superior, mesmo que isso implique em abrir mão do presente em favor de um futuro cuja existência somente pode ser admitida mediante uma fé religiosa.

27 de outubro de 2009

Dinheiro!

Uma vez um cara muito doido disse que o amor ao dinheiro é a raiz de todo mal. Então, seus seguidores se espalharam pelo mundo pregando suas palavras. E hoje cobram por isso.

Dinheiro: Meio ou fim? Na teoria é sempre um meio, mas na prática é um fim. Será? Acho que não. Explico.

Hoje em dia o ócio é praticamente imoral. Nós realmente acreditamos que o nosso tempo precisa ser gasto integralmente com atividades produtivas, que na verdade é um eufemismo para trabalho. Aceitamos entregar setenta por cento de nosso tempo em troca de trocados (desculpe o trocadilho =p). Isso significa que vivemos para trabalhar, o que significa que vivemos para ganhar dinheiro. Mas pra quê? Pra comprar coisas. Que coisas? Qualquer coisa, principalmente coisas que você nunca vai precisar.

Uma das utilidades do dinheiro

Não estou aqui pra falar mal do capitalismo e muito menos do dinheiro, mesmo porque eu gosto muito dele. Mas quero sim falar mal do valor que o dinheiro ocupa em nossas vidas. O dinheiro, e o que ele representa, foi elevado ao status mais elevado em nossa sociedade. Medimos o valor de uma pessoa pelas roupas que usa, carro que possui, local onde mora e por aí vai. E sendo essa a referência de Valor, todos perseguimos esse ideal.

E o que leva as pessoas à compulsão de juntar dinheiro, sem haver um destino previamente planejado para esse dinheiro?
Por exemplo, imagine uma pessoa que trabalha seis horas por dia e com o que ganha, consegue se manter e ter uma vida que ela considera confortável. Então ela recebe uma proposta para trabalhar oito horas por dia e ganhar mais dinheiro. Certamente ficará tentada a aceitar. Mas porquê, se ela já tem tudo que necessita para se manter de forma satisfatória e essa proposta requer que ela sacrifique ainda mais o seu precioso tempo? A resposta é que, por mais que ela tenha tudo o que precisa, ela nunca tem tudo o que deseja.

Nunca ninguém está plenamente satisfeito. Queremos sempre mais. É da nossa natureza criar novas expectativas para substituir as que foram correspondidas. E no modelo capitalista essas expectativas se concentram quase que totalmente nos bens materiais. Mal desembalamos a televisão de quarenta polegadas que acabamos de comprar, e já queremos uma de cinquenta, depois sessenta e por aí vai. Por isso que uma pessoa aceita sacrificar seu tempo, desde que isso signifique a possibilidade de juntar mais dinheiro que, por sua vez, significa a possibilidade de saciar mais de seus muitos desejos consumistas.

Agora o pulo do gato.

Dinheiro pra nada e mulheres de graça Por que as pessoas juntam dinheiro, mas hesitam na hora de convertê-lo em satisfação? Porque gostam de manter quantias consideráveis no banco enquanto sonham com o mais novo lançamento? Se temos uma vontade, e temos dinheiro para satisfazer essa vontade, o que nos impede? Eu respondo: As outras vontades.

O consumismo está tão arraigado em nós, que somos incapazes de querer uma coisa de cada vez. Queremos a televisão de cinquenta polegadas, mas queremos também trocar de carro, viajar pra Miami e reformar o apartamento. Oh dúvida cruel! Tantos desejos e tão pouco dinheiro para satisfazê-los. Os nossos desejos evoluem exponencialmente em relação ao nosso dinheiro. Temos mil dinheiros, queremos bens que totalizam dois mil. Temos dois mil? Então o que queremos custa quatro mil, e por aí vai. Não importa quanto dinheiro nós temos, nunca será o suficiente. Nossa vontade é infinita, como a do glutão asqueroso do Sentido da Vida.

Dessa forma, tal qual formigas strippers zumbis, nós juntamos, juntamos e juntamos à espera do dia em que teremos dinheiro para comprar tudo o que queremos. Dia esse que nunca chegará. Além disso, o dinheiro no banco tem um significado muito especial. Significa possibilidades. Mesmo que o dinheiro que temos não compre tudo o que queremos, ele certamente é suficiente para comprar uma parte do que queremos. Enquanto ele estiver lá, quietinho no banco, nós nos confortamos em sonhar com as possíveis satisfações que ele pode trazer. Mas não podemos nunca gastá-lo, senão o sonho acabada, e aquilo que compramos ironicamente deixa de nos satisfazer assim que abrimos a embalagem.

26 de outubro de 2009

A Caverna na Matrix

Cypher está em um restaurante, acompanhado do agente Smith. Ele negocia os termos de sua traição enquanto saboreia um suculento filé. Ele sabe que aquele filé não existe. Nada ali existe, todo o cenário é uma simulação da Matrix.
  • - Mundo real. Ah, que piada! Você sabe o que é real? Vou dizer o que é.
Então ele corta um belo pedaço de bife, espeta com o garfo e fica segurando à sua frente, admirando sua textura, cheiro, cor, como é tenro e macio.
  • - Real é apenas uma palavra de quatro letras.
Ele ri e põe o bife na boca, e mastiga com vontade. It's so fucking good.
  • - Eu sei que esse bife não existe, eu sei que quando ponho ele na boca e mastigo, a Matrix está dizendo ao meu cérebro que ele é suculento e delicioso. Após todos esses anos, sabe o que eu percebi? Ignorância é felicidade.

E assim, por meio de um bife, essa cena do filme Matrix lida com uma das maiores questões da filosofia: A relação entre a realidade e os sentidos. Será que aquele bife digital é menos real que um bife de verdade? O que é a realidade, senão uma ideia que criamos em nossas mentes, a partir da infinidade de sinais que recebemos dos cinco sentidos? Será que os sentidos capturam fielmente o mundo exterior?

Certamente não. Podemos afirmar que os sentidos capturam apenas uma parte do que existe e, mesmo assim, de forma limitada. Por exemplo, de todo o espectro luminoso, a visão captura apenas uma parte infinitesimal. Jamais saberemos que cores existem antes do vermelho ou depois do violeta. O arco-íris que se forma no céu tem, de fato, muito mais que as sete cores que enxergamos. O mesmo se aplica aos outros sentidos. Cada um deles é capaz de perceber apenas uma parte insignificante de tudo o que existe.

Realidade x Existência

Indo além, podemos deduzir que tudo o que existe possui outras propriedades além das que podemos perceber, mas que jamais tomaremos ciência de quais possam ser, simplesmente por nos faltarem os sentidos para percebê-las.

A realidade, então, é algo muito limitado. É algo muito menor e mais restrito do que aquilo que existe. Imagine a caverna de Platão. Enquanto estamos na caverna, aquela é a realidade. Não há volume e nem cores. Quando saímos da caverna a realidade se torna mais rica, porém o que existia permaneceu inalterado. O que mudou foi apenas a nossa percepção. Então, na verdade, podemos dizer que nunca saímos da caverna, pois nunca chegamos ao conhecimento pleno de tudo o que existe. São infinitas cavernas, uma dentro da outra.


Roteiro de Matrix:

Livro:

24 de outubro de 2009

Cinefilô – Cinema e Filosofia

A sétima arte de vez em quando nos presenteia com filmes que duram bem mais que os noventa minutos de exibição na tela. São filmes que, de tão bons, nos acompanham por dias, meses, alguns até pela vida inteira. Esses filmes tem algo além de ação e uma boa direção.

São filmes com conteúdo. São histórias que provocam um saculejo nos neurônios e deixam uma pulga atrás da orelha. Para mim, os melhores filmes têm sempre uma mensagem, um ponto de vista novo a oferecer. Por isso os filmes que trazem à tona as grandes questões filosóficas são tão especiais, principalmente quando oferecem uma nova roupagem, mais atual e compativel com a nossa realidade.

CinefilôEstou lendo o livro Cinefilô, de Ollivier Pourriol, cuja proposta é justamente despertar o pensamento filosófico que existem nos bons filmes.

A partir de filmes como Beleza Americana, Forrest Gump, X-men, Highlander, Clube da Luta, Blade Runner e, obviamente, Matrix, ele comenta as cenas mais significativas e, de forma fluída e leve, dá ótimas aulas de filosofia. Certamente depois de ler esse livro não vou ver filmes com os mesmos olhos.

Ele pega emprestado, por exemplo, a cena do glutão asqueiroso no restaurante francês do filme O Sentido da Vida, do Monty Python para ensinar o conflito que existe entre querer e poder. Enquanto a vontade é ilimitada, a potência é limitada. Queremos tudo, mas não podemos tudo. De fato, podemos muito pouco diante do que queremos, não é mesmo? Assim se apresenta a figura da escolha. Diante de tantas vontades e tão pouca capacidade, somos obrigados a escolher e, dessa forma, renunciar. Cada escolha implica uma renúncia, e talvez por isso seja tão dificil escolher, pois quem gosta de abrir mão das suas vontades?

O glutão é incapaz de renunciar. Tudo que lhe foi oferecido, aceitou, e ainda pediu um ovo por cima. O resultado não podia ser diferente, e ele explode. Afinal, o corpo é pequeno demais para caber todas as nossas vontades.

Traz um Sundae agora.

E assim o livro segue, cena após cena, lição após lição.
Estou lendo esse livro de noite em voz alta, acompanhado do meu filho de cinco anos. É claro que ele não entende nada. Mas é uma delicia ver como ele fica quietinho, escutando e prestando atenção. 
     - Ele explodiu, né pai?
     - É, filho. Ele queria comer tudo que tinha no restaurante, mas não coube na barriga dele.
     - Se eu comer tudo eu “expludo” também?
     - Não, mas passa muito mal e tem que ir para o hospital.
     - Hum.. Não vou comer tudo não.